Os jovens vão salvar o mundo? Hum… Se dependermos de jovens como Greta Thunberg (uma jovem ativista ambiental), sim, mas se apostarmos todas nossas fichas em jovens (ou inspirados por empreendedores) do Vale do Silício, provavelmente a resposta será não (não mesmo, cara). Mas como não!? Ora, é algo simples de constatar, tão simples que talvez você possa até comer a descoberta.
Imagine que você quer uma empresa. Ela tem que ser moderna, quase como se fosse um laboratório. Haveria jovens muito inteligentes nela vestindo roupas divertidas. Para viabilizá-la você precisaria contar com largos investimentos (não se preocupe com a origem da grana, apenas acredite que eles serão vultosos e a fundo perdido). E, a essa altura, você já desenvolveu um super algoritmo muito eficiente. As pessoas não podem saber muito sobre ele, pois provavelmente não entenderiam e é estratégico não dizer nada – alguém pode ir lá e copiar. O seu produto poderia ser vendido, tudo indica, para o mundo todo! Por que se contentar com pouco, não é mesmo?
Continue com a abstração (não solte a minha mão): veja-se numa disputa com muitos outros jovens tão ou até mais inteligentes que você (eles só não sabem interagir e parecerem descolados como você faz quando sorri e dispara piadas machistas). Como se destacar e se mostrar merecedor da atenção de algum investidor anjo(!?)? Bom, que tal se apresentar, então, como uma não-empresa? Não consigo ver nada mais inovador que isso. Você tem uma empresa, tem empregados, paga impostos, tem equipamentos, tem até cadastro de pessoa jurídica, mas diz que não é uma empresa! Por que diabos alguém faria isso? Mas, por que não? Ou, na língua correta, why not?
O roteiro é basicamente o mesmo de muitas empresas do setor de tecnologia. Alguém ou um grupo de pessoas monta uma startup e tudo começa a fluir se você souber vender a sua ideia. O objetivo desses empreendedores nunca é claro ou tangível, porque eles pensam longe e você não é tão sagaz quanto eles (lamento, mas a maioria medíocre está limitada a consumir e, no máximo, dar sua opinião em algum lugar que ninguém vai ler ou se importar). O marketing tem o incrível poder de nos colocar diante de uma simples garrafa de água e dizer que o que estamos vendo, na verdade, não é só uma garrafa de água, mas, alto lá, toda uma experiência tecnológica e um jeito novo de beber água! Afinal, não é uma garrafa de água qualquer, trata-se de bottle-tech ou smartwater – whatever. Poderia fazer isso até morrer. Digo que algo deixa de ser o que é e acrescento ‘tech’ no fim ou ‘smart’ no começo.
(…) na realidade, a gente deseja que a mudança aconteça: lutamos por direitos igualitários, queremos um mundo melhor para as próximas gerações, uma indústria alimentícia sustentável, oceanos limpos, menos plásticos, bem-estar animal… [NotCo]
A citação acima, pasmem, está no site empresa NotCo. Sua maionese, ops não-maionese, pode ser encontrada, em São Paulo, no supermercado Pão de Açúcar (conhecido pelo seu elitismo em fazer o que qualquer mercado faz: vender de tudo que os outros também vendem, mas mais caro e com alguns produtos mais diversificados e melhores ao som de jazz – ou Clarice Falcão). A embalagem da NotMayo continua sendo embalagem mesmo: de plástico (e bem grosso, desses que serão encontrados daqui a décadas intactos numa praia qualquer) e seu produto é difícil de tirar de lá quando está no fim. Diferentemente de sua principal concorrente, a maionese Hellmann’s “Vegana” ou mesmo a maionese da Superbom (ambas também vendidas em embalagens de plástico), a NotMayo, apesar de sê-lo, não se apresenta como um produto vegano. E nisso reside um fato interessante.
Aproveite a não-palestra para melhorar seu espanhol, afinal, o Mercosul deixou de ser uma iniciativa bolivariana este ano.
Apresentar-se como empresa de tecnologia é mais atraente (a única opção, na verdade) no Vale do Silício do que como uma empresa que vende produtos veganos para veganos de carteirinha. Na verdade, uma outra empresa do ramo da foodtech, a Hampton Creek (que há não muito tempo alterou seu nome para Just Inc após se envolver em alguns escândalos e ver toda sua diretoria pedir demissão) , identificou através de pesquisas que atrelar seus produtos ao veganismo era um problema a ser superado. Veganos são vistos como pessoas que se sentem moralmente superiores e isso poderia travar as vendas. Como esses jovens são muito atentos, eles sacaram que é melhor ser neutro: vende-se para o vegano hipster da Vila Madalena (bairro de São Paulo) e para o tio do churrasco gourmet querendo impressionar os sobrinhos para além do ‘pavê ou prá comê’. Deve ser a parte do igualitarismo ao qual eles se referiam…
Falando por mim, posso indicar que veganos animalistas (eu incluso) não se sentem moralmente superiores à toa. Na verdade há uma boa razão para se sentir superior a um especista: temos uma preocupação sincera com a vida dos animais quando se escolhe comprar ou usar algo que não envolva a matança ou a exploração animal. Tanto a Hellmann’s quanto a NotCo não se preocupam com os animais (ou com o meio ambiente, com as criancinhas, com a turma do asilo, com trabalhadores rurais, com a perseguição política na China etc) quando vendem seus produtos. Eles agem dentro do sistema: sempre miram o consumidor e nunca o cidadão. O marketing, claro, vai variar bastante de uma para outra (talvez toda a nossa incrível e única criatividade, de fato, esteja sendo sugada pelas escolas de marketing e pelo setor financeiro), fora isso, o que temos é firula e mais firula.
Sim… sou de esquerda (além de vegano animalista abolicionista). Apesar de, nos dias de hoje, não me ver representado em lideranças ou partidos… É, talvez só mesmo alguém como a jovem Greta seja uma das poucas esperanças nas quais alguém que vive no país do agronegócio possa se agarrar. Mas antes de me perguntar sobre o Lula, tenha calma, leitor. Veja a seguinte citação da qual extraio de um contumaz esquerdista igualmente desiludido (isso já em 1966, quando você provavelmente nem era nascido ainda), o Darcy Ribeiro, com as suas próprias referências:
A Rússia conseguiu, como sua façanha maior, infundir em multidões um corpo de ideais generosos em nome dos quais as mobiliza para o combate ao atraso e à pobreza. Isso é muito melhor do que o empanturramento material e próspero, sem mensagem de que se alimenta a juventude alemã ocidental ou a yankee. Mas é também uma nova Idade Média, homogênea em suas crenças e disciplinada por guardiães da tradição.
Respondo a isto e à perplexidade em que poderia cair, com a crença de que nos cabe a nós, a intelectualidade dos povos morenos e pobres, a função de nos fazermos o novo sal da Terra. Tendo tarefas específicas de luta contra o atraso e a miséria que nos aquecerão o peito por décadas, nós, os deserdados e discriminados que não possuímos bombas, temos uma autoridade moral de importância decisiva neste mundo em crise de valores. E precisamos usá-la. Podemos entrar no diálogo do homem com uma postura mais sólida, com autoridade para exigir o internamento dos loucos-donos-da-bomba; de exigir dos chinos e dos soviéticos fidelidade às lealdades humanísticas de que se dizem herdeiros. [Uma carta amarga, em Correio IMS]
Darcy Ribeiro morreria outra vez se pudesse retornar e ver em que pé estamos (com uma esquerda delirante e uma extrema-direita tomando de assalto corações e mentes). A nossa superioridade moral, a de não termos uma bomba atômica (que é capaz de destruir toda a vida que conhecemos) está, até ela, ameaçada. Aventou-se, há não muito tempo, ter uma para “pacificar” a região (!?). É uma ideia ridícula vinda de alguém, ao qual, todos aqueles que não defendem algo do tipo, podem se sentir tranquila, intelectual e moralmente superiores.
A NotCo e a Hampton Creek não se reconhecem como empresa de alimentos, mas de tecnologia. Você, por acaso, já ouviu uma certa empresa que diz algo parecido? É… o Facebook não se vê como uma empresa de comunicação / mídia, mas de tecnologia. Além de ter alavancado um populismo antes só visto em becos escuros da internet, eles agora vão criar uma moeda própria e interferir no sistema financeiro mundial e, ainda assim, quando forem novamente chamados para darem esclarecimentos, dirão que não são como um banco com moeda própria, mas uma empresa de tecnologia. Eu, não sou eu, eu sou a fada do dente! É o que direi quando algum cobrador (ou a polícia do pensamento) bater à porta.
We really view [NotCo] as a fast-prototyping platform for new foods. [An Algorithm Is Coming for Your Food]
Gabando-se de um algoritmo poderoso, batizado de Giuseppe (em referência ao pintor italiano Giuseppe Arcimboldo), a turma da NotCo avalia combinações possíveis das moléculas de vegetais para chegar ao sabor, textura e cor correta do alimento. Potencialmente, assim, eles podem criar réplicas vegetais de qualquer coisa. Very clever, boys! O clube do bolinha não conta como a feitiçaria é feita. E não é feitiçaria, é tecnologia, como diria a pupila de Luciano Huck, este uma estrela patrocinadora da nova política brazuca.
A Uber também não se vê como uma empresa de transporte, veja só! Adivinhe: eles são uma empresa de… ? Claro, de tecnologia. Como poderia ser diferente, afinal, eles fizeram um app que conecta um motorista e um passageiro para eles dividirem uma carona, não é? Como diriam os velhos Cassetas: “impressionante”! Em um país frágil como o nosso, os lucros possíveis com tal façanha tecnológica faria picadinho das nossas “antiquadas” leis trabalhistas. Dito e feito! E o modelo de negócio (esqueci de comentar no início, mas sem um modelo de negócios, você não é ninguém, não adianta mais dizer que viu Fellini, ou que leu Sartre, o lance para impressionar qualquer um é ter um plano de negócios possível de ser explicado em 2 minutos num animado pitch) é tão incrivelmente adaptável que funciona para o Arbnb, para o iFoods etc. Mas assim como os jumentos (os animais) foram substituídos por motocicletas no nordeste (e descartados / abandonados por parte das pessoas que os escravizaram por séculos – e que empresários chineses e governo querem abatê-los para lucrar com suas mortes), um outro animal será substituído, daqui a algumas décadas, pela automação de tudo o que puder ser automatizado. A Uber, a empresa de transporte de pessoas que não é empresa de transporte de pessoas, diz que só se tornará verdadeiramente lucrativa quando se livrar de seus “parceiros” humanos. Somos os jumentos da vez! E vale dizer que não uso a palavra jumento no sentido de ofensa, porque eles, os jumentos, são mamíferos adoráveis e tão incríveis quanto cachorros e gatos, por exemplo. Como já cantou Luiz Gonzaga, eles são nossos irmãos. Bois e vacas, porcos, cabras também são incríveis. Possuem personalidade, gostam de brincar (é!), mas os colocamos em nossos pratos, já dissociados de suas formas vivas (procurem pelo termo “referente ausente” usado por Carol J. Adams, no seu célebre livro Política sexual da carne). Há quem defenda esse sádico prazer com unhas e dentes, apesar de nossas unhas e dentes serem inúteis se fôssemos de fato o topo da cadeia alimentar (não somos, só para lembrar).
E deixo claro a todos: a superioridade moral da qual me gabo já não é mais aquela de antes… Estamos numa época estranha. Alguns diriam de transição, mas como observou Jaime Pinsky certa vez numa palestra lá pelos anos 2000, estamos sempre num período de transição. O nosso tempo presente nos torna testemunha de grandes transformações, as quais temos pouco ou nenhum poder de reversão. Trocar o hambúrguer de carne animal por vegetal pelas vias do mercado não altera verdadeiramente a realidade implacavelmente regida pelo poderoso mercado – vale o mesmo para a maionese (quem acha que as maioneses, para além da metáfora, poderão mudar o mundo, está enganado, sinto informar). Pode aliviar um pouco a barra de alguns poucos animais (trilhões morrem todos os anos pelos mais variados motivos: virar comida é o principal deles e essa também é uma das principais causas do aquecimento global e por global entenda globo terrestre, a forma do nosso planeta, Terra), mas a exploração deles continua, porque suas vidas estão embrenhadas na cadeia produtiva de um sem número de segmentos das poderosas indústrias do mundo todo (da moda, da farmacêutica etc). O fazendeiro orgulhoso de seu gado que se transformará em carne orgânica (!?) é só mais um dos mercadores da morte… Há muitos outros ocultos, lucrando alto com o vai e vem das commodities.
A verdadeira superioridade moral da nossa época é lastreada pela tecnologia ou, melhor dizendo, é a moral tecnológica que irá prevalecer (e nos transformar em outra coisa, certamente, desprovida de valor quando tirarem todas as informações que precisam de nós). Se você não domina a linguagem das máquinas, se você não é autor de um algoritmo de prestígio, se sua conta no Github tem poucos seguidores, você não é ninguém e, portanto, não tem recursos para bater de frente com o que vem por aí. Esqueça as celebridades que hoje arrastam multidões aos shoppings para fazerem arremedos de shows que envergonhariam até mesmo a mais triste das plateias numa escola de um rincão esquecido sem recursos composta por velhos e cansados agricultores alheios ao Youtube, ao Instagram ou ao App ladrão de dados da moda e ao seu prato cheio de alimentos plant-based. Em tempos de um desejo por uma ética relativizada, ou seja, num tempo em que é necessário ceder um pouco de suas rigorosas conclusões (animais não devem ser mortos), tudo parece se encaixar perfeitamente (como num código bem escrito).
Para o melhor ou para o pior – e creio que tenhamos todas as razões para estarmos tanto temerosos quanto esperançosos -, a classe realmente nova e potencialmente revolucionária na sociedade consistirá em intelectuais, e seu poder potencial, ainda que até agora desapercebido, é muito grande, talvez grande demais para o bem da humanidade. Mas isso são especulações. [Sobre a violência, de Hannah Arendt]
Umas das mentes mais brilhantes do século XX (quase destruída pelos nazistas de extrema-direta, desculpem a redundância que se faz necessária) especulava sobre as comunidades científica e intelectual de sua época. As da nossa consistem em menos intelectuais e em mais cientistas (cada vez mais de dados?). Ainda temos intelectuais, claro, mas eles, quando provenientes das famigeradas ciências humanas, recebem destaque relativo ou até nulo. Byung-Chul Han, Bruno Latour, Ultrich Beck, Peter Sloterdijk, Evgpeny Morozov ou Yuval Noah Harari (nenhum deles, pelo que consta, autointitulou-se intelectual; eles estudaram de verdade, têm diploma na parede e tal). Apenas os dois últimos podem, talvez, ter alcançado as mentes de jovens talentosos que ao se descobrirem como prodígios abandonaram de imediato as universidades mais prestigiosas do mundo para tocarem seus negócios ou não-negócios. Para ser justo, alguns concluem os cursos. Mas invariavelmente eles cruzam os braços, saindo de uma condição em que nunca entraram, a de estagiários ou aprendizes (pela idade) já em bosses, posando para aquelas fotos bacanas de revistas de negócios em que só os caras de sucesso alcançado ou prometido podem figurar (às vezes alguma mulher aparece como forma de concessão; negros ou minorias seguem na fila). As universidades só serviram como um teste: eles são capazes de entrar, mas são tão bons que as superaram e seus docentes, laboratórios, prestígios, fraternidades e bibliotecas já não conseguem mais guiá-los para o futuro. As universidades são um trampolim, numa visão otimista, porque de fato elas já não valem mais de nada (o Brasil figura como exemplo ao mundo de destruição do conhecimento humanístico). Bauman!? Zygmunt Bauman está morto… Assim como, por aqui, esperam por nós Antonio Candido, Eclea Bosi, Bento Prado Junior e tantos outros. Por sorte eles não verão a destruição de seus legados.
A skin Beef Boss em Fortnite no modo de jogo Food Fight. E, reparando bem, não deixa de ser um ótimo cosplay para empreendedores do foodtech.
Desprovidos, do que só as ciências humanas podem dar, os intelectuais do futuro tecnológico constroem nossas realidades morais, orquestradas por Kubernetes ou não, em cadafalsos ao estilo Fortnite: eles montam e desmontam enquanto fugimos para ou de uma realidade artificial. Na ficção distópica de Mad Max (1985), no globo da morte, dois homens entravam e apenas um saia vivo de lá; uma situação sinistra até que não tão improvável assim em tempos de guerra por petróleo mundo a fora. Hoje, vários homens misóginos entram, mas ainda um só pode sair: Battle Royale não é um estilo de jogo, é um não-jogo que todo mundo vai ter que jogar, cedo ou tarde. Metáfora do individualismo máximo, o simulacro dos nossos fracassos aguarda o início da próxima partida arrematada com uma estúpida dancinha.
Mas voltando à vaca fria, ou seja, aos cadáveres dos animais que serão poupados pela misericordiosa ação dos foodtechers e quejandos, a tradicional Burger King (que você deve ter visto brilhando como quase um personagem em Stranger Things 3, consumando o poder norte americano de nos fazer chorar e rir com a desventura tola de meninos tolos contra tolos monstrengos), também entrou nessa de hamburguer vegetal. Eles continuam sendo fast-food (e matando animais, e adoecendo pessoas, e destruindo o meio ambiente, e oferecendo sub-empregos), apesar do hambúrguer vegetal parecer ter sido inventado ontem (não foi!). Eles não produzem suas refeições com algoritmos. Não: eles são oldschool. Mas ainda assim vão vender o Impossible Burger (que foi testado em animais), este sim, tecnologia pura! A Lanchonete da Cidade, infinitamente menor que a concorrente, vai de Futuro Burger! Que como Bento Carneiro, que era um vampiro brasileiro e, como todo vampiro, adorava sangue, a empresa é fruto do esforço e trabalho da nossa gente. Vai, Brasil!
E não é engraçado? A Futuro Burger é do mesmo criador da Do Bem, que hoje pertence a Ambev, que todo mundo sabe, é Do Mal (eles patrocinam rodeios e os animais, pelo que consta, assim como nos matadouros, não se voluntariam a serem montados, torturados e mortos para o delírio sertanejo). E na NotCo há um conselheiro que é empregado da Nestlé e para quem quiser ler Expulsões, de Saskia Sassen, ela reserva algumas páginas às traquinagens dessa adocicada empresa que faz o seu querido Kitkat. Rio com as tristes convergências que o capital nos propicia. Eu poderia dizer até que a grande maravilha do capitalismo é poder unir um nazista e um pacifista numa mesma plataforma. Eu até poderia chamar isso de uma nova forma de comunhão, as redes sociais, se algo assim já não existisse.
Este hambúrguer não é para veganos, mas para converter, diz a empresa, comedores de carne em vegetarianos ou veganos. Será? E, sinceramente, vejam a parafernália necessária para criar o Impossible Burger. Tá com cara de salsicha… E nem dá pra saber se é um alimento seguro. Até a poderosa FDA parece ter dúvidas.
A Fazenda Futuro acabou de conseguir US$ 8.5 milhões em investimentos. Que legal, não? Me parece que investidores estão muito preocupados com o futuro, mas não com o futuro dos animais: eles estão mesmo é preocupados com o futuro do hambúrguer – e de quanto isso poderá render no futuro mais próximo possível. A rodada de investimentos que beneficiou a Fazenda do Futuro foi capitaneada pela Monashees (empresa de capital de risco), a mesma que ajudou negócios como 99, Rappi e Yellow florescerem. Ao entrarem nessa ciranda do capital, os donos das empresas tornam-se cada vez menos donos de suas próprias empresas (e, consequentemente, ideais). A contrapartida pelo investimento é uma participação fracionária no negócio. Daí que o idealismo que quer salvar o mundo através da tecnologia, pedra de toque no imaginário do Vale do Silício, terá que, depois do aporte, passar pelo crivo também dos investidores. A Seara, da JBS (campeã em abate de animais e pivô de escândalo de corrupção envolvendo grandes lideranças políticas de todos os espectros ideológicos), por exemplo, não poderia ficar fora dessa (de salvar o mundo, os animais, as flores etc) e também já tem seu produto com base vegetal. Para quem crê que os animais estão na pauta deve ficar atento, pois é ingênuo achar que a verdadeira motivação dessa turma é impedir nossas iminentes catástrofes ambientais. Nesse sentido, você deve tirar a sua bike dobrável da chuva, jovem.
Da minha parte, acho ótimo quando alguém deixa de comer um hambúrguer com partes de animais mortos para comer algo que definitivamente pode ser até mais saudável como um hambúrguer de grão-de-bico que pode ser feito em casa ou comprado no supermercado como os da marca Gerônimo Foods ou até mesmo comer em hamburgueria exclusivamente vegana. A carne vermelha é potencialmente cancerígena e carne processada, como o bacon, é cancerígena, conforme pesquisas de agências da ONU apontam. Não cooperar com a exploração animal (essa que é a mais longeva escravização da qual se tem notícia e que ainda ocorre em todos os cantos do mundo, sem exceção, praticada por ricos e pobres, informados e desinformados) é algo salutar.
Se o Burger King (ou a Futuro Burger, a Impossible Foods, a NotCo, a Lanchonete da Cidade etc) vender apenas produtos com base vegetal, o passado não será reparado, mas com isso se deixa de contribuir para que mais animais sejam mortos (o impacto dessa ação no mundo todo seria grande demais no sentido positivo, talvez uma das poucas coisas boas que poderiam acontecer de modo tão amplo na história da humanidade: o fim da escravidão animal). Vale o mesmo para empresas que deixarem de usar leite (a exploração das vacas é, provavelmente, a mais cruel da indústria de “alimentos”) e ovos (o destino de galinhas, frangos e pintinhos é igualmente terrível). Só não é preciso esperar que um algoritmo resolva isso por você, camarada. Eu mesmo (ou alguém que você possa ter ignorado em algum momento), em carne e osso, por intermédio dessas máquinas que já não compreendo bem como funcionam, posso te assegurar: é melhor viver sem esse sentimento de que está aí algo que eu poderia fazer já, de pronto; algo que eu posso mudar agora mesmo, mas só ainda não fiz nenhum movimento nesse sentido por uma justificativa qualquer que eu queira dar. Parar de contribuir com a exploração animal foi o melhor life hack que me aconteceu.